“Dono do mundo em mim, como de terras
que não posso trazer comigo.” (Pessoa, F.) 1
Trouxe essa concha retorcida pelas dores do tempo que, mais que
tempestades, nos amedronta; como se os Deuses quisessem
punir os humanos por tanto mal que têm causado.
Sento-me ao teu lado, a brisa suave do Tejo nos acalanta.
O sentimento de alegria me invade. Afinal…esperei tanto
por esse momento! Fez silêncio… e confesso:
Sei que não sou nada…, mas, perto de ti, posso ser o que quiser e
confessar o quanto amo tua escrita! Vim de terras distantes
que teus ancestrais, na grande aventura de conquistar o Mundo,
se apossaram. Laços nos une e o legado da escrita é o grande elo.
Num grande desassossego, trouxe essa concha retorcida que retirei
ao mar de minha terra para expressar nesse gesto as imagens
que nos Lusíadas são expostas exibindo poder e dor do teu povo!
Agora, diante de tua Lisboa de mil faces, belezas raras escondendo
labirintos em cujas janelas sombras e ruídos, silêncio, dor, horror e
das lágrimas que lavam a alma! Manhã de névoa de outono a envolve,
num manto leve, que o sol foi crescentemente dourando, as casas múltiplas,
os espaços abolidos, os acidentes da terra e das construções…as feições da
cidade renasceram do escorregar da máscara do velamento… e na nudez
uma visão…episódio da imaginação que chamamos realidade.
Num deslumbramento despeço-me e… quem sabe, retornarei para
alimentar a alma e tomar o saboroso café que tanto apreciavas.
E, quando na busca de mim e não me encontrar… retornarei à
tua escrita para ter emoções descritíveis como as de agora sinto que
expresso nessas Letras Graciosas!
1 LIVRO DO DESASSOSSEGO, São Paulo, Companhia das Letras, 1997