CAPÍTULO IV – UM CAMINHO PARA O COMEÇO
ITINERÁRIO MARXIANO PARA COMPREENSÃO DA ECONOMIA POLÍTICA
É importante destacar que, quando Marx e Engels falam de economia política, não estão se referindo a uma disciplina acadêmica, nem a uma especialização universitária, mas àquelas concepções que, a partir do último terço do século XVIII, procuram dar conta das novas formas de sociedade postas pelo mundo do capital. Ou seja, a expressão “economia política” denota aqui um bloco de saber, concepções teóricas que emergem especialmente na Inglaterra e que procuram compreender as novas formas de sociabilidade do mundo do capital. É uma concepção teórica que não se restringe a um estudo especializado, uma vez que a economia política é, no plano do conhecimento teórico, a representação unitária e global da constituição da sociedade burguesa e de seu desenvolvimento. A teoria política surge como compreensão do mundo burguês. As obras seminais sobre essa questão são elaboradas por Adam Smith e David Ricardo, cujas preocupações estavam no que se passava nas fábricas, como era seu funcionamento. Buscavam compreender a sociedade, entendida como totalidade.
É a economia política que Engels procura entender antes de Marx, em 1842-43. A partir do estudo de Engels, Marx elabora a crítica social, que havia iniciado em 1843, já afirmando que não é o Estado que funda e explica a sociedade civil; antes, pelo contrário, o Estado é sua expressão. Por isso, não se pode fazer uma crítica jurídico-política do Estado, sem entender como se estrutura e funciona a sociedade civil.
Na economia política está a essência da sociedade civil. É preciso, então, estudar a economia política para dar conta da sociedade civil e, consequentemente, do Estado. É por esse caminho que Marx compreende que é preciso lavrar.
Em 1844, diante de tal marco histórico, com os elementos culturais que Marx mergulha na compreensão da economia política, e seu ponto de partida de 1843, começa a delinear-se um movimento que arranca em busca da compreensão da sociedade, ou seja, da realidade social. É então que o destino intelectual de Marx se define, de modo radicalmente original, no sentido da compreensão da ordem burguesa, da sociedade regida pelo capital.
Os textos marxianos, desse período, que assinalam seu ritmo de maturação teórico-metodológica são, em primeiro lugar, dois dos que publica nos Anais Franco-Alemães, no primeiro semestre de 1844. Dessa revista, saiu um número duplo e único, mas não sobreviveu por razões de ordem financeira e política. Seu editor não conseguiu mantê-la, embora a inviabilidade também estivesse vinculada a questões de ordem política, tendo em vista o envolvimento de Marx com o Movimento Operário. Nesse momento, rompe com Arnold Ruge, um dos fundadores da Revista, desfazendo a parceria. Outro texto é A Questão Judaica, uma polêmica contra Bruno Bauer. E A Crítica da Filosofia de Hegel – Introdução. Este será importantíssimo na construção e desenvolvimento de seu pensamento, embora tenha ficado apenas na introdução.
Este texto deve ser analisado junto com os Manuscritos de 1843, embora tenham construções diferentes. Também no único número da Revista Anais foi publicado o Ensaio sobre Economia Política, de Engels.
É ainda em 1844, fruto do estudo que fez sobre economia política, que Marx produz cadernos de apontamentos, bem como textos de autoclarificação, com estrutura próxima à do Manuscrito de 1843. Na realidade, em seus escritos, Marx polemiza com os autores que estuda, esse era seu método de investigação. Tanto é que parte de seus apontamentos será publicada posteriormente sob o nome de “Manuscritos Econômico-filosóficos de Paris”, embora apareça na bibliografia como “Manuscritos de 1844”₁₅ .
São também desse período “A Sagrada Família”, publicada em 1845, e “A Ideologia Alemã”, publicada postumamente. Essas duas obras foram produzidas por Marx e Engels, no período em que trabalharam juntos. Assinalam o desdobramento do encontro ocorrido em 1844, mesmo que suas estruturas composicionais sejam diferentes. Em A Sagrada Família, cada autor escreve uma parte, enquanto a Ideologia Alemã advém de uma discussão comum. Na sequência d’A Ideologia Alemã, Marx escreve as Teses ad Feuerbach, que foram publicadas por Engels, na década de 80, do século XIX.
A Sagrada Família é um diálogo com os autores alemães que estavam inseridos na polêmica sobre a realidade social da época. Essa obra como que inicia a evolução intelectual de Marx, porque nela está exposto o seu rompimento com toda tradição da filosofia e da ideologia alemã.
₁₅A Crítica da Filosofia do Direito – Introdução está na Revista TEMAS, número 2, que começa a circular de 1977, agoniza em 1980, e termina em 1981. Editou 10 números, com estudos de brasileiros, bem como de pensadores estrangeiros.